No dia 21 de setembro de 2022, foi publicada a Lei nº 14.457/2022, que, entre outras providências, institui o Programa Emprega + Mulheres, altera a CLT e o Programa Empresa Cidadã.
Conforme dispõe seu art. 1º, o Programa Emprega + Mulheres tem o objetivo de promover a inserção e a manutenção de mulheres no mercado de trabalho por meio da implementação das seguintes medidas:
- para apoio à parentalidade na primeira infância por meio do pagamento de reembolso-creche; e da manutenção ou subvenção de instituições de educação infantil pelos serviços sociais autônomos;
- para apoio à parentalidade por meio da flexibilização do regime de trabalho: teletrabalho; regime de tempo parcial; regime especial de compensação de jornada de trabalho por meio de banco de horas; jornada 12 por 36; antecipação de férias individuais; e horários de entrada e de saída flexíveis;
- para qualificação de mulheres, em áreas estratégicas para a ascensão profissional: suspensão do contrato de trabalho para fins de qualificação profissional; e estímulo à ocupação das vagas em cursos de qualificação dos serviços nacionais de aprendizagem por mulheres e priorização de mulheres hipossuficientes vítimas de violência doméstica e familiar;
- para apoio ao retorno ao trabalho das mulheres após o término da licença-maternidade: suspensão do contrato de trabalho de pais empregados para acompanhamento do desenvolvimento dos filhos; e flexibilização do usufruto da prorrogação da licença-maternidade, conforme prevista na Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008;
- reconhecimento de boas práticas na promoção da empregabilidade das mulheres, por meio da instituição do Selo Emprega + Mulher;
- prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho; e
- estímulo ao microcrédito para mulheres.
1. DO APOIO À PARENTALIDADE NA PRIMEIRA INFÂNCIA
Inicialmente, cumpre destacar que para efeitos legais, parentalidade é o vínculo socioafetivo maternal, paternal ou qualquer outro que resulte na assunção legal do papel de realizar as atividades parentais, de forma compartilhada entre os responsáveis pelo cuidado e pela educação das crianças e dos adolescentes (art. 1º, § 1º, Lei nº 14.457/2022).
Dito isso, passamos à análise das medidas propostas pela nova lei.
1.1. Reembolso-Creche
A Lei nº 14.457/2022 autoriza os empregadores a adotar benefício de reembolso-creche, destinado ao pagamento de creche ou de pré-escola de livre escolha da empregada ou do empregado que possua filhos com até 5 anos e 11 meses de idade, bem como ao ressarcimento de gastos com outra modalidade de prestação de serviços de mesma natureza, comprovadas as despesas realizadas.
O reembolso-creche deverá ser oferecido de forma não discriminatória e sem a sua concessão configurar premiação, sendo formalizado por meio de acordo individual, de acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho, que estabelecerão suas condições, prazos e valores.
Ainda, ato do Poder Executivo federal disporá sobre os limites de valores para a concessão do reembolso-creche e as modalidades de prestação de serviços aceitas, incluído o pagamento de pessoa física.
Conforme art. 4º do diploma legal, os valores pagos a título de reembolso-creche não possuem natureza salarial, não se incorporam à remuneração para quaisquer efeitos, não constituem base de incidência de contribuição previdenciária ou do FGTS e não configuram rendimento tributável da empregada ou do empregado.
Por fim, nos termos do art. 5º, caput, Lei nº 14.457/2022 e art. 389, § 1º, da CLT, nos estabelecimentos em que trabalharem pelo menos 30 mulheres com mais de 16 anos de idade, os empregadores são obrigados à organização de local apropriado onde seja permitido às empregadas guardar sob vigilância e assistência os seus filhos no período da amamentação.
O empregador, contudo, ficará desobrigado da instalação de local apropriado para a guarda e a assistência de filhos de empregadas no período da amamentação caso adote o reembolso-creche. Para isso, é necessário que se dê ciência da existência do benefício e dos procedimentos necessários à sua utilização e que se conceda o reembolso-creche a todos os empregados e empregadas que possuam filhos com até 5 anos e 11 (onze) de idade.
1.2. Da Manutenção ou Subvenção de Instituições de Educação Infantil pelos Serviços Sociais Autônomos
A nova lei autoriza que Sesi (Serviço Social da Indústria), Sesc (Serviço Social do Comércio) e Sest (Serviço Social do Transporte) (serviços sociais autônomos) mantenham instituições de educação infantil destinadas aos dependentes dos empregados e das empregadas vinculados à atividade econômica a eles correspondente.
2. DO APOIO À PARENTALIDADE POR MEIO DA FLEXIBLIZAÇÃO DO REGIME DE TRABALHO
2.1. Do Teletrabalho
Para o preenchimento de vagas que possam ser efetuadas por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância, os empregadores deverão dar prioridade às empregadas e aos empregados com filho, enteado ou criança sob guarda judicial com até 6 anos de idade ou com deficiência, sem limite de idade.
2.2. Da Flexibilização do Regime de Trabalho e das Férias
Considerados os poderes diretivo e gerencial dos empregadores e a vontade expressa dos empregados e das empregadas que tenham filho, enteado ou pessoa sob sua guarda com até 6 (seis) anos de idade ou com deficiência, haverá priorização na flexibilização do regime de trabalho ou férias em relação a uma ou mais das seguintes medidas: regime de tempo parcial (art. 58-A da CLT); compensação de jornada (art. 59 da CLT); jornada de 12 por 36 (art. 59-A da CLT); antecipação de férias individuais; e horários de entrada e de saída flexíveis.
2.2.1. Compensação de jornada
Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho de empregado as horas acumuladas ainda não compensadas serão descontadas das verbas rescisórias, se negativo o saldo, e pagas juntamente com as verbas rescisórias, se positivo.
2.2.2. Antecipação de férias individuais
Poderá haver a antecipação de férias individuais ainda que não tenha transcorrido seu período aquisitivo e não poderão ser usufruídas em período inferior a 5 dias corridos.
Seu pagamento deverá ser realizado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo e o pagamento do 1/3 constitucional poderá ser efetuado até a data de pagamento do 13º salário (20 de dezembro de cada ano).
Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho, os valores das férias ainda não usufruídas serão pagos juntamente com as verbas rescisórias devidas e, na hipótese de período aquisitivo não cumprido, descontadas das verbas rescisórias no caso de pedido de demissão.
2.2.3. Dos Horários de Entrada e Saída Flexíveis
Quando a atividade permitir, os horários fixos da jornada de trabalho poderão ser flexibilizados em intervalo de horário previamente estabelecido, considerados os limites inicial e final de horário de trabalho diário.
3. DAS MEDIDAS PARA QUALIFICAÇÃO DE MULHERES
3.1. Da Suspensão do Contrato de Trabalho para Qualificação Profissional
Conforme disposto na Lei, a norma pretende estimular a qualificação de mulheres e o desenvolvimento de habilidades e de competências em áreas estratégicas ou com menor participação feminina, tais como ciência, tecnologia, desenvolvimento e inovação. Para tanto, poderá haver a suspensão do contrato de trabalho para qualificação profissional, que dependerá de requisição formal da empregada interessada e será formalizado por meio de acordo individual, de acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho, nos termos do art. 476-A da CLT.
Durante o período de suspensão do contrato de trabalho para a realização de curso ou o programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, a empregada receberá bolsa de qualificação profissional de que trata o art. 2º-A da Lei nº 7.998/1990. Ainda, o empregador poderá conceder à empregada ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial.
Se ocorrer a dispensa da empregada durante a suspensão do contrato ou nos 6 meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador pagará à empregada as parcelas indenizatórias, além de multa a ser estabelecida em convenção ou em acordo coletivo, que será de, no mínimo, 100% do valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato de trabalho.
4. DO APOIO AO RETORNO AO TRABALHO APÓS O TÉRMINO DA LICENÇA-MATERNIDADE
4.1. Da Suspensão do Contrato de Trabalho de Pais Empregados
O Programa Emprega + Mulheres prevê, ainda, a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho de pais empregados. Essa hipótese de suspensão do contrato ocorrerá nos mesmos moldes da suspensão do contrato de trabalho da mulher para qualificação profissional, ou seja, (i) dependerá de requisição formal do empregado interessado; (ii) será formalizada por meio de acordo individual, de acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho; (iii) ocorrerá nos termos do art. 476-A da CLT, inclusive com a concessão de bolsa de qualificação profissional; (iv) haverá a incidência de multa caso ocorra a dispensa do empregado durante a suspensão do contrato ou nos 6 meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho etc.
A grande diferença está no momento em que se autoriza essa hipótese de suspensão do contrato de trabalho: após o término da licença-maternidade da esposa ou companheira do empregado. Percebe-se, portanto, que é uma medida protetiva à mulher, ao recém nascido e à parentalidade, muito mais que ao pai. Conforme consta da própria lei, seu objetivo é possibilitar que os pais possam prestar cuidados e estabelecer vínculos com os filhos; acompanhar o desenvolvimento dos filhos; e apoiar o retorno ao trabalho de sua esposa ou companheira.
4.2. Das Alterações no Programa Empresa Cidadã
Com a promulgação da Lei nº 11.770/2008, o Programa Empresa Cidadã passou a autorizar a prorrogação do período da licença-maternidade (de 120 dias), por mais 60 dias. Nem todas as empregadas, entretanto, têm direito à prorrogação. Somente se preenchidos os dois requisitos a seguir:
- empregada da pessoa jurídica que tenha aderido ao Programa da Empresa Cidadã; e
- pedido de prorrogação deve ser feito, pela empregada, até o fim do 1º mês após o parto.
Se o empregador aderir ao Programa Empresa Cidadã, preenchidos certos requisitos legais, a empregada poderá requerer a prorrogação da licença-maternidade de 120 dias para 180 dias.
A Lei nº 14.457/2022 promove alterações no Programa Empresa Cidadã, para estabelecer que essa prorrogação poderá ser compartilhada entre a empregada e o empregado, desde que ambos sejam empregados de pessoa jurídica aderente ao Programa e que a decisão seja adotada conjuntamente.
Ainda, a empresa participante do Programa Empresa Cidadã autorizada a substituir o período de prorrogação da licença-maternidade pela redução de jornada de trabalho em 50% pelo período de 120 dias. Para tanto, dois são os requisitos:
- pagamento integral do salário à empregada ou ao empregado pelo período de 120 dias; e
- acordo individual firmado entre o empregador e a empregada ou o empregado interessados em adotar a medida.
5. DAS MEDIDAS DE PREVENÇÃO E DE COMBATE AO ASSÉDIO SEXUAL E A OUTRAS FORMAS DE VIOLÊNCIA NO ÂMBITO DO TRABALHO
Dentre as diversas providência adotadas pela Lei nº 14.457/2022, estão, ainda, medidas de prevenção e de combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho.
Com a publicação da Lei, a CIPA, que agora se chama Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio, tem mais uma atribuição: a promoção de um ambiente laboral sadio, seguro e que favoreça a inserção e a manutenção de mulheres no mercado de trabalho.
Para tanto, deverão ser adotas as seguintes medidas:
I – inclusão de regras de conduta a respeito do assédio sexual e de outras formas de violência nas normas internas da empresa, com ampla divulgação do seu conteúdo aos empregados e às empregadas;
II – fixação de procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias, para apuração dos fatos e, quando for o caso, para aplicação de sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos pelos atos de assédio sexual e de violência, garantido o anonimato da pessoa denunciante, sem prejuízo dos procedimentos jurídicos cabíveis;
III – inclusão de temas referentes à prevenção e ao combate ao assédio sexual e a outras formas de violência nas atividades e nas práticas da CIPA; e
IV – realização, no mínimo a cada 12 (doze) meses, de ações de capacitação, de orientação e de sensibilização dos empregados e das empregadas de todos os níveis hierárquicos da empresa sobre temas relacionados à violência, ao assédio, à igualdade e à diversidade no âmbito do trabalho, em formatos acessíveis, apropriados e que apresentem máxima efetividade de tais ações.
Importante: essas medidas deverão ser adotas em até 180 da publicação da Lei.
Trata-se de uma medida importante para prevenir, nas empresas, as diversas formas de assédio, especialmente o assédio sexual, e outras formas de violências.
6. DO SELO EMPREGA + MULHER
A nova, ainda, instituiu o Selo Emprega + Mulher, para reconhecer as empresas que se destaquem pela organização, pela manutenção e pelo provimento de creches e pré-escolas para atender às necessidades de suas empregadas e de seus empregados; e reconhecer as boas práticas de empregadores que visem, entre outros objetivos, estímulo à contratação, à ocupação de postos de liderança e à ascensão profissional de mulheres, divisão igualitária das responsabilidades parentais e promoção da cultura de igualdade entre mulheres e homens.
As empresas detentoras do Selo Emprega + Mulher poderão utilizá-lo para os fins de divulgação de sua marca, produtos e serviços, vedada a extensão do uso para grupo econômico ou em associação com outras empresas que não detenham o selo. Microempresas e as empresas de pequeno porte que receberem o Selo Emprega + Mulher serão beneficiadas com estímulos creditícios adicionais.
Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência disporá sobre o regulamento completo do Selo Emprega + Mulher.
7. ALTERAÇÕES NA CLT
A Lei nº 14.457/2022 altera o art. 473 da CLT, que dispõe sobre as hipóteses de interrupção do contrato de trabalho, para prevê que o empregado poderá deixar de comparecer ao serviço sem prejuízo do salário por 5 dias consecutivos, em caso de nascimento de filho, de adoção ou de guarda compartilhada (adequação do texto da CLT ao disposto na Constituição Federal – art. 10, § 1º, do ADCT); e pelo tempo necessário para acompanhar sua esposa ou companheira em até 6 (seis) consultas médicas, ou em exames complementares, durante o período de gravidez.
8. VETO PRESIDENCIAL
A Lei nº 14.457/2022 é fruto da conversão da MP nº 1.116/2022, que foi aprovada pelo Congresso Nacional em 31/08/2022 na forma de Projeto de Lei de Conversão. Dessa forma, passou pelo veto/sanção do Presidente da República.
O art. 21 do texto aprovado pelo Congresso Nacional dispunha sobre as regras de formalização de acordos individuais, consignando que somente poderiam ser realizados nos casos não haver acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho celebrados ou, havendo, fosse o acordo individual mais vantajoso à empregada ou ao empregado que o instrumento coletivo vigente.
Contudo, tal dispositivo foi vetado pelo Presidente da República, sob o argumento de contrariedade ao interesse público. Segundo as razões de veto apresentadas, expressão “medidas mais vantajosas” contida no dispositivo vetado era imprecisa e acarretaria insegurança jurídica, representando retrocesso em relação à Reforma Trabalhista.
Alexandre Noal dos Santos
OAB/RS 91.574
Fonte: Comunidade 100% Trabalhista. Professor Henrique Correia.